quarta-feira, 15 de junho de 2016

A Chuva Eternizada no Abraço...






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Por volta dos meus 8 anos, morava perto da escola, quase um quilometro de distância da minha casa. Mesmo assim, a minha mãe me levava e ia buscar sempre. Neste período, eu estudava à tarde. Confesso que não gostava quando a minha mãe interrompia as minhas brincadeiras e ordenava que eu fosse tomar banho, para ir à escola; era quase uma morte das minhas horas de prazer, vestir aquele uniforme que todos vestíamos, achava uma monotonia e falta de colorido a perturbar a liberdade do meu imaginário e da minha individualidade.

A minha mãe era super protetora e autoritária, mas tinha uma presença mágica em cada detalhe, e com tantos talentos. A casa e tudo era cercado pelo seu gesto e suas construções femininas de bordados, pinturas. Tanto eu e quanto a minha irmã, éramos vestidas com roupas belíssimas, confeccionadas por ela. Eu sempre pedia para fazer a mesma roupa para minha boneca.

A minha mãe tinha fobia em relação ao barulho de trovão, era algo que a perturbava de forma sem controle, uma fobia mesmo! Todos da família sabiam que se chovesse muito com trovão, ela precisava de socorro. Ela ficava assustada e buscava abrigo; se estivesse em casa, ficava na cama debaixo de cobertas sobre a cabeça e quando passava o trovão, tudo normal.

Ela me deixou na escola, com um beijo rápido na cabeça e seguiu com o olhar a minha entrada na sala de aula. No meio da tarde começou a chover muito e de repente os trovões. Quando na saída, a Freira do colégio me avisou para esperar o meu irmão mais velho que vinha me buscar. Imediatamente me lembrei da minha mãe e não pensei duas vezes, saí correndo do colégio para minha casa, tomando um banho de chuva, com o pensamento fixo de salvá-la do medo do trovão, ela estava sozinha em casa e quem iria protegê-la?

Quando cheguei a nossa casa tudo fechado e eu a gritar por ela bastante tempo. A vizinha tinha levado-a para sua casa e me chamou. Entrei e fui para os braços da minha mãe, chorando e ela também, eu dizia soluçado que queria protegê-la do trovão, ela com uma toalha bem fofa me enxugando, dizendo que eu era muito corajosa, mas nunca mais fizesse isso, tinha que esperar um adulto para me buscar na escola. A vizinha se aproximou de mim e disse: “muito bonito este seu amor pela sua mãe!” e me deu um beijo na testa.

Noutro dia, fiquei em casa com gripe, por conta da chuva que levei, mas a minha mãe cuidando de mim e eu com status de super-herói, na cama brincando com as minhas bonecas e aconselhando a não andar na chuva sem capa.

Até hoje me lembro das cenas e o meu sentir de socorrer a minha mãe do medo e, quem sabe, isso não teria me levado à escolha da minha profissão de Psicóloga. A vida tem mistérios tão belos construídos num bordado de sentidos e significados.

Sempre que chovia com trovão, onde eu estivesse, telefonava para minha mãe, para saber dela. Após a ligação, eu me encontrava com a minha menina correndo na chuva e o nosso abraço. E, assim, a minha mãe, a minha menina e o nosso abraço moram sempre dentro de mim, com o lembrete do amor que cuida e abraça no grito de socorro!...



Suzete Brainer (Direitos autorais registrados)

Imagem: Obra de Lauri Blank.



21 comentários:

  1. Que lindas e tocantes recordações, Suzete. E com certeza divisivo na escolha de sua profissão, essas fobias inexplicáveis aparentemente onde tudo começou em algum lugar do assado, no lodaçal do medo. Muito com, abraços.

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  2. Suzete,
    Essas boas lembranças da infância e da adolescências levaremos por toda a vida, como se fossem nossas âncoras. Parabéns pela bela crônica, falando de sua mãe, quem sabe a sua âncora.
    Abraço.
    Pedro.

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  3. Muito bom contar a meninice,o que ficou retido e volta nas recordações.
    Tenho imenso prazer nessas leituras do cotidiano e se são pueris tanto mais bonitas são.
    Um abraço Suzete

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. delicadas linhas de um rosto. de um carácter - esboço ainda.

    belíssimo regresso aos dias de infância.

    beijo

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  6. Olá, Suzete.
    Tão bonitas recordações, contadas de uma forma tão gostosa, que dá prazer ler.
    Vou te confessar: também tenho muito medo de trovoada, não chegando a um nível de fobia, mas chega lá perto. Mas, se eu estiver na rua, aí, minha amiga, é loucura: da última vez ia a conduzir e a chuva tanta, a trovoada aterradora, nem sei como consegui continuar caminho...

    bj amg

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  7. Poucas crianças são capazes de gestos como o teu.
    Mas não será que a psicóloga deveria ser bombeira...? rsrs...
    Gostei imenso do teu texto. Como sempre, aliás.
    Suzete, tem um bom fim de semana.
    Beijo.

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  8. PS: pensando melhor, uma psicóloga é uma bombeira da mente...

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  9. Querida Su,

    Belíssima esta tua crônica, a arte da tua linguagem,
    a tua voz mágica nos guiando nesta imensa e sublime
    humanidade que te pertence. Sim, tu desde pequena
    com este teu olhar sensível e solidário.
    És uma excelente e competente Psicóloga e uma
    excelente e inspirada Escritora, viu?...
    Adorei te ler, minha amiga querida.
    Estava com saudade deste teu espaço de encanto
    de literatura. Ainda estou com as limitações
    de net e por isso tão ausente (tu sabes...).

    Beijos e abraço cheio de saudade!
    Nara.

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    1. Narinha,

      E eu com aquela saudade de receber o teu
      olhar generoso e amigo no que eu escrevo.
      Querida amiga, espero que tu possas passear
      mais por aqui e eu colher as tuas palavras
      carinhosas e de uma atenção tão luminosa!
      Beijos e abraço recheado de gratidão.

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  10. Guardamos na memória nossas histórias...
    Bjbjbj Lisette

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  11. Boa noite querida Suzete.
    Muito emocionante o seu relato da linha ligação com a sua mãe. Uma protegendo a outra. Eu e a minha filha somos assim, ela me socorrendo e eu a ela rsrs. Amei a oportunidade amiga de ler um relato, lembrança cheio de amor. Meus parabéns por ter essa sensibilidade que é umas das suas qualidades visível e adimiravel. Um lindo domingo. Grande abraço.

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  12. Poder voltar à infância com lembrança tão vívida é gratificante, sobretudo reveladora de desprendimento e amor. A memória guarda o gesto que nunca será ignorado.
    Abraços,
    P.S.: Quebrando o silêncio e as névoas...

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  13. Suzete , este cuidar carinhoso desde menina nos mostra quão sensível você é . Muito bom conhecê-la . Beijos

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  14. lindo, tirando a gripe
    o amor eterno...
    a proteção :)

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  15. Maravilhosas lembranças, Suzete. Comoventes até, na forma como fala em proteger sua mãe. Um texto excelente.
    Beijos.

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  16. Que lindo e comovente texto, Suzete. Quanto sentimento nessa crônica! Você, cuidando de sua mãezinha, preocupada em protegê-la... Você está na profissão certa! Dar um jeitinho nos emocionais, nos traumas. Pular medos e ir socorrer.
    Grande beijo, parabéns pelo tocante texto.

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  17. Oi Suzete!
    Linda recordação.
    Quanta saudade e quanto amor cabem dentro de um abraço.
    Ótima semana,
    Sônia

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  18. Nossa Su, quanta delicadeza! É engraçado como algumas passagens marcam tanto, e voltam sempre que as circunstâncias imitam o cenário. O amor eterniza mesmo! Lindo!

    *Minha amiga, me perdoa, ando sentindo muito, mas manifestando pouco, queria mesmo conseguir me estender, pois que dentro, as emoções são reticentes, mas tímidas...

    Um beijo imenso neste teu coração que é lindo, e que a tua noite seja muito abençoada.

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  19. Que lindo, Suzete! Na última postagem o amor e cuidados de tua mãe para com a saúde bucal, e neste o teu cuidado e amor por um medo de tempestades, trovões, etc. Uma protegendo a outra! E não é a isto que o amor verdadeiro sempre se propõe?
    Linda a relação que as unia e mágica e bela as lembranças que te fazem escrever páginas tão doces e tão ternas.

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  20. Tão comovente este gesto, Suzete! Está explicada a devoção que ainda brota do teu coração!
    Adorei ler!
    (Em pequena tinha medo da trovoada e escondia-me entre os cobertores.)
    Meu bjo, querida :)

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