Imagem: Obra de Alice X. Zhang. Uma Pausa no Blog. Votos de Boas Festas e que cada um, na sua singularidade, caminhe (no movimento dos girassóis...) com os seus dias solares!... Beijo e Abraço de Paz! Suzete.
Ela estava serena e delicadamente plena, se entardecendo nos seus sentires amanhecidos de saudade. Uma saudade com cheiro de hortelã mergulhado no chocolate amargo e quente...
Ela sabia da brevidade da vida, tudo deveria ser degustado em gotas de espanto e prazer. No espanto mora o inesperado e o prazer é um suspiro de beleza e verdade poética...
Ela não gostava de fazer planos de consumo, isso é empobrecer o encanto sutil do viver; o sonhar é tão perto (dentro do sentir) e buscar fora para carregar a mala de supérfluos, não lhe seduzia. Sempre precisou da leveza do desapego!....
Sempre quis o genuíno livremente. Ser inteiro de corpo e passeio na alma, impregnada de sorrisos aventureiros sem correntes que se apropriem da verdade do sentir...
Sempre acreditou na lealdade das mãos dadas na caminhada a dois. Na amizade dos olhos que se conhecem e dizem tudo. No silêncio partilhado na paz que abraça e na parceria do preto e branco das rotinas que não esmagam a sublimidade do prazer (solar) de se estar juntos.
Ela flutuava na leveza enquanto as palavras desfolhavam a sua singularidade na brisa do agora!...
Tinha eu por volta dos 8 a 9 anos, quando a minha professora
convida-me para participar de uma encenação teatral representativa das raças
originárias da miscigenação do nosso país. Ela quis determinar a escolha de cada criança pela adequação que ela imaginava sobre cada raça que compõe a população brasileira, ou seja: uma criança loura representaria a raça branca; uma negra representaria a a raça negra; morena, cabelo escorrido, representaria a indígena; a mestiça, alguém que lhe parecesse mais adequada a representar a cor mestiça. Daí ela ordenou que eu
fosse da raça branca, fez isso com entusiasmo na voz, como se tivesse me
premiando a ocupar o pódio vencedor. Inesperadamente surpreendida com a minha
recusa em participar do mural, ao lhe dizer que só participaria se eu fosse a índia e não
a branca, ficou muito desconsertada com a minha atitude. O inusitado da situação foi a expressão facial da professora, ela
totalmente incrédula sobre a minha teimosia em querer ser índia, e não branca, na encenação.Visivelmente Irritada, fez uma pressão enorme sobre mim, para me convencer que a opção de ser branca era superior, valorizada e almejada por todos. Quando ela
argumentada, usava do recurso da pausa na fala, para provocar em mim o efeito de
assimilar as suas informações. Eu, bem plácida e irredutível, na minha certeza de só querer ser a índia
no mural. No final, ela bastante brava com o fracasso da subjugação e eu acompanhando-a na dança da irritação, para, finalmente, carimbar que não iria participar de nada, se eu não fosse a índia. Ela me deu um bilhete intimando a minha mãe
comparecer comigo numa reunião marcada por ela.
Chegando em casa, entreguei o tal do bilhete para minha mãe,
sem comunicar nada do ocorrido na escola com a professora. Noutro dia, a minha
mãe compareceu e escutou toda argumentação da educadora. Com a objetividade
característica da minha mãe, ela perguntou à Mestra se a atividade
era obrigação curricular, ela disse que não, que era um evento facultativo a cada criança que quisesse participar. Prontamente minha mãe comunicou à professora que respeitava a vontade de sua filha não participar
deste evento.
Na volta à casa, minha mãe somente me fez uma pergunta
– Por que eu queria ser a índia?
Eu lhe respondi: Porque os índios são livres, amam a
natureza, tomam banho de rio e cachoeira e moram na Floresta Amazônica.
Minha mãe não disse nada, somente fez aquele olhar (um olhar
com o sorriso explodindo nos olhos! ...).
Hoje, venho declarar o meu amor a ti, democracia, com uma suavidade de um bailar de palavras sopradas pacificamente em teu palco-pátria; sem que o preconceito aproprie-se do ar, sem que uma superioridade autoritária asfixie o teu oxigênio respirável, do respeito às diferenças de ideias.
Quero te sentir sempre nesta pátria verde-amarela e de todas as cores. Quero ser embalada pelos teus sons diversos, ritmos multiculturais e com todas as mãos: brancas, pretas, indígenas, mestiças, abraçadas em única nacionalidade.
Democracia o teu canto não é violência, segregação e autoritarismo. O teu canto é alegria da conquista da tua liberdade histórica. Quero os teus campos verdes com os índios donos desta terra e nunca esquecer a nossa filiação miscigenada.
Ah, quero a minha pátria na sua simbologia de um sorriso aberto, ritmo nos quadris e a superação com a sua pulsão de vida, no ato criativo da transcendência das crises. Sempre vou querer a minha pátria livre com as plantações e as colheitas do Respeito Pelas Diferenças! ...
Sabes, mãe, mais um aniversário teu, com o mesmo sentir deste
elo constante entre nós duas. Os espaços que nos separam, vida e morte, não
significam distância e fim.
Somos as mesmas, filha e mãe que se abraçam nesta ilusão que
as horas marcam a contagem da existência.O amor é o único significado que constrói na memória a vibração da vida que permanece sem intervalos...
Hoje e amanhã seremos estes nossos olhares compreendidos na
pauta da melodia do silêncio que nos veste... (Seria seu aniversário no dia 05/09. Saudades eternas e a certeza deste elo de amor que faz a presença diária dela num sopro leve, protetor e eterno...)
Suzete Brainer (Direitos autorais registrados)
Imagem: Obra de Ingrid Tusell.
Caros amigos e leitores do Piano que Toca Poesia
Infelizmente o meu espaço ficará em Pausa. É notório para todos
que estou com a dificuldade sobre a disponibilidade de tempo para as postagens, aqui no meu espaço, e também para as visitas nos espaços dos amigos. Espero que
eu possa voltar em breve para a continuação desta convivência, que sempre nomeei
como um voo da partilha das artes, das amizades e da sensibilidade humana; que
ela nunca nos falte. Este mundo cada vez mais nos parece um portal desértico de
gestos solidários.
Agradeço a todos os amigos e visitantes com suas presenças,
leituras silenciosas e registros com seus comentários que
constituem uma dinâmica saudável e evolutiva da arte poética e literária, aqui partilhada
no decorrer destes anos do Piano que Toca Poesia.
Ela não sabia nada e apreciava este libertar-se das
pretensões dos donos da verdade. Colecionava seus sorrisos com muito zelo neste
passeio pela existência. Lembrava-se sempre do respirar profundo ao sentir o
vento desalinhar os seus cabelos, a natureza exala o perfume do jardim
cultivado na delicadeza dos gestos incondicionais.
Pensava, pensava que a vida é urgente na sede de senti-la, sê-la
e desnudá-la de qualquer possibilidade de apropriação.
A vida é mágica no aprendizado de não se perder nos falsos controles,
no movimento de sempre se achar dentro de si, no tom da sensibilidade que
humaniza.