segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

A Menina de Cabelos de Sol...




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Depois de saboroso lanche feito com seus doces caseiros e o bolo da vovó, sentávamos, na cadeira grande de balanço, eu com 7  anos, no seu colo, à hora das histórias inventadas por ela, como música na construção do meu imaginário e na marcação do som, a cadeira de balanço no ritmo da minha curiosidade infantil acelerada ...

“Era uma vez uma menina dos cabelos de sol, loiros e longos até a cintura. Morava no mundo do Sol, tudo lá era dourado e brilhante... Não existiam brigas, todo mundo falava pelo pensamento e no pensamento, as palavras são mansas, moram bem perto do coração. A menina e sua família viviam felizes e lá todas as famílias eram felizes. Todas as casas tinham jardins de rosas de todas as cores e perfumes. Não tinha noite, pois o Sol é que regia sempre; uma vez a um ano tinha uma Lua cheia que ficava por 7 dias e ela e o Sol ficavam juntos, como uma dança. Alguns momentos ficavam noite com clarão da Lua e outros dia com o Sol regendo. Um dia o Sol brigou com a Lua cheia e todos foram atingidos por essa briga. Ninguém mais entendia o outro. As famílias começaram a brigar todos os dias. Quem foi mais atingida foram as rosas e todas morreram: algumas queimaram, outras murcharam e se despetalaram... A menina, que era muito amiga das rosas, ficou muito triste e nunca tinha conhecido a tristeza. Os seus olhos ficaram sem brilho, a sua voz sem o canto e não queria mais dançar. Enquanto todos brigavam, ela, a única que ficava calada e triste num canto do jardim sem rosas... “

Eu queria saber o que aconteceu com a menina e a minha avó me fazia esperar para outra tarde de sessão de histórias inventadas e contadas por ela. Eu aguardava esta tarde com os meus olhos brilhando de curiosidade, imaginava que o tempo era muito chato e não gostava de histórias, pois demorava tanto para chegar o dia... Ficava perguntando as horas para minha mãe e ela, intrigada, me dizia: "que tanto eu queria saber das horas?...”

Quando cheguei à casa da minha avó, de imediato fui para cadeira de balaço, argumentando que precisava saber da menina dos cabelos de sol e o lanche ficaria para depois da história contada... Ela riu, dizendo que eu tinha fome de história imaginada!...

“A menina dos cabelos de sol estava muito fraquinha, não queria mais abrir os olhos para o mundo desmantelado daquele... Nem a mãe dela notava que a tristeza nela, estava sugando a sua luz-vida, todos continuavam na animação para as brigas de dia e de noite, de noite e de e dia... Foi quando o Sol resolveu se separar de vez da Lua cheia e, assim: os dias ficaram com o Sol e as noites com a Lua, mas a Lua muito contrariada com a decisão do Sol, resolveu se expressar por períodos, os seus sentires femininos na oscilação das vibrações. Ela passou a influenciar as marés e o mundo do Sol nunca mais ficou o mesmo. Todos se acostumaram com o mundo do Sol desfeito, mas ela não. Um dia bem cedinho, antes de o Sol nascer, ela fugiu para dentro dele e hoje aqueles raios do Sol, fininhos, são os cabelos dela!...”

Enquanto comia o meu lanche, não parava de pensar na menina e perguntei a minha avó:
- A menina ficou alegre lá. Naquele lugar a tristeza nunca mais vai entrar nela, né isso, minha avó?
- Ela pode ser maior que a tristeza! (minha bonequinha...)
-A senhora devia contar essa história para Mainha e meu Pai pararem de brigar. Os adultos brigam muito! Nós, crianças, quando brigamos, fazemos as pazes logo...
-É, minha querida, as crianças sabem brincar com a vida!...
-Vou brincar com as minhas bonecas e todas irão morar no mundo do Sol, quando não foi desfeito...
-Vó, quando tiver bem chato lá em casa, eu voo até o Sol e fico com os meus cabelos junto com os cabelos da menina!...
- Sim. A menina era parecida com você!...
- Você sabe como voar?
- Sei, Vó. É fechando os olhos e imaginando!...
- Isso, minha bonequinha!... 




 Suzete Brainer (Direitos autorais registrados)

 Imagem: Obra de Richard S. Johnson.



29 comentários:

  1. Que lindo e realmente tantas crianças assistem pais brigando... Que boa essa conversa com a vó...Linda! bjs, chica

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  2. Fantabulástico texto! Amei ler, que lindo!!

    Beijinhos

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    1. Sempre grata com a tua gentileza ímpar aqui,
      poetisa inspirada!
      Beijinhos, Cidália.

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  3. Querida Suzete, boa noite!
    Quanta poesia nas linhas ensolaradas desta sua fabulosa prosa
    Penso que todos nós deveríamos poder voar para a terra do sol reluzente até que os momentos de tensão fossem exauridos de nossas vidas. Um texto maravilhoso, com acentuado lirismo poético. Parabéns amiga
    Beijos e um feliz carnaval pra você

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    1. Querida Gracita,

      Muito grata pelo generoso e valoroso
      comentário, minha amiga!
      Beijos e um feliz feriado para você.

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  4. Olá, Suzete!
    Lindo conto, o pensamento nos permite ir muito longe, voar para fora de si mesmo.
    Eu não conheci meus avós, sempre imaginei que devia ser muito bom colo de avó. Hoje procuro ser uma vó assim, que pega no colo, conta história e faz guloseimas.
    Sua vó deve ter sido muito especial.
    Um abraço,
    Sônia

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    1. Querida Sônia,

      Sim, foi muito especial e mora dentro de mim!...
      Tenho certeza que você deve ser uma avó especial
      e sábia...
      Grata pela presença e comentário aqui!
      Um abraço afetuoso.

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  5. Minha Amiga:
    Que belo conto nos acaba de contar.
    Tão bom que deveria ser publicado, fazer parte de leitura escolar e...deixá-lo deslumbrar toda a criançada.
    Só mesmo o Mauro de Vasconcelos e o seu "Pé de Laranja Lima", se poderá comparar.(Não é demais, não!) .
    Pense nisso, entretanto vou...Vou levar.Espero concordar...
    Um bj, Suzete, bom resto de carnaval (sei que não gosta mto, como eu que não estou afim... rsrsrs, mas ninguém leva a mal.)

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    1. Caro Luís,

      Muito grata pela tua leitura e comentário generoso!
      Claro que pode levar para o seu espaço de generosidade
      com os escritos dos amigos...
      De fato, tu adivinhastes, carnaval para mim é um feriadão para descanso...
      Grata, meu amigo!
      Bj.

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  6. ... e assim se criam asas para a vida!
    uma "estória" verdadeiramente mágica. excelentemente contada.

    adorei conhecer as "astúcias" da Lua na sua efémera briga com o Sol.

    excelente, minha amiga

    beijo

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    1. Caro Manuel,

      Sempre muito grata pela tua generosidade com
      comentários belos e valorosos.

      Aprecio sempre e aguardo a tua leitura inteligente
      na contribuição do meu exercício com a escrita...
      Beijo, meu amigo.

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  7. Que delícia este seu voltar à infância querida Suzete.
    A sua avó era muito sábia pois conseguiu o jeitinho certo de alimentar a sua imaginação.
    Acho que a menina de cabelos de sol mora no peito deste então.

    Um beijinho terno

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    1. Querida Fernanda,

      Sim, muito sábia e costumo dizer que ela foi a
      minha mestra do meu universo imaginário.
      Sou grata e aprecio imensamente a tua leitura
      sempre sábia e carinhosa que acrescenta, minha
      querida amiga!
      Um beijinho terno e grato.

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  8. Suzete ,
    que delícia a história que sua avó lhe contava em capítulos .
    Desde cedo você aprendeu que para voar só é preciso imaginar .
    A bonequinha sentada no colo da vovó tornou-se esta escritora e poeta que nos encanta a cada post .
    É o brilho do sol sempre presente .
    Obrigada pela partilha e pelos votos de feliz aniversário para minha mãe .
    Beijos , amiga .

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    1. Minha querida amiga,

      Muito grata pela tua presença luminosa e generosidade
      de comentário sempre. E eu aguardo a tua presença
      solar sempre, pois este carinho da amizade nos
      renova e nos faz voar pelas palavras sinceras e
      incentivadoras!...
      Não precisa agradecer pelos votos, amiga.
      Beijo grato!

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  9. Olá Suzete.
    Esta história, "A menina de cabelos de sol..."sempre será uma agradável leitura, pois contém ela a ternura das vovós do mundo, que somene elas consseguem ter. Parabéns.
    Abraço.
    Pedro.

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    1. Muito obrigada pela leitura atenciosa e a
      gentileza pelo incentivo, Pedro!
      Abraço.

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  10. Tens uma imaginação muito fértil e sabes espicaçar a curiosidade. Este conto tem encanto, ritmo e boa mensagem. Está fantástico, Suzete! Parabéns.

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    1. Querida Teresa,

      Muito obrigada pela tua leitura atenciosa e com
      este comentário generoso de um olhar de
      uma grande Poeta!
      Beijo grato!

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  11. Uma menina luminosa a tua personagem!

    Beijinhos

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  12. Uma história deliciosa.
    E muito bem imaginada e contada.
    Gostei muito.
    Bom fim de semana, amiga Suzete.
    Beijo.

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  13. Que texto lindo! De uma beleza e candura imensas!...
    Para ler e reler, Suzete!
    Como sempre, uma publicação excepcional, de qualidade ímpar!...
    Adorei!!! Beijinho! Bom fim de semana!
    Ana

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  14. Bem, se não foi a avó que contou, é a neta a ter a avó na sua matriz imaginativa, sensível e doadora.
    Ambas sabemos da relevância que as avós tiveram nesse processo. A tua, além do que referi, era uma educadora por natureza (e, já agora, com um saber nato para prender um ouvinte), um ser humano de uma larga visão humanista.
    Esta linda e doce história é bem um exemplo do que acabei de expressar.
    Bjo na tua alma, Suzete :)

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  15. De repente fez-me regressar também à infância. Uma maravilha este diálogo de neta e avó com a historinha pelo meio. Muito bem escrito, para além do conteúdo fascinante. Adorei!
    Beijinho

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